Estes têm sido tempos
estranhos... estranhos, estarrecedores, esclarecedores, iluminadores, penosos,
sofridos, alegres, transparentes etc . É incrível como as coisas - tudo e todos,
mudam, se moldam, se modificam, se volatilizam. Mudam as pessoas, os lugares,
os jeitos, as prioridades, os focos, os desfoques, os desejos, os sabores, os
dissabores, e assim infinita e indefinidamente. Outrossim, não escapei desse
vendilhão de mudanças, não há como. É estarrecedor ver o quão bem nos faz o
tempo, que passa da forma que quer, quando quer. O quão fortemente ele nos
fortalece, nos alimenta, nos sustenta, e nos mata. A despeito deste
último, não hei de reclamar.
Hoje, felizmente, as
coisas não são mais como eram e, amanhã, serão ainda mais diferentes.
Hoje as coisas estão claras, as situações clichês, e as pessoas não têm mais o
mesmo significado. Hoje eu sei quem sou - in/out, me amo, me abomino, me
idolatro e me amisero. Hoje, cansei das desimportâncias, dos julgamentos (meus
e dos outros), e digo para quem quiser ouvir que: assim eu sou, assim eu serei. Claro, sempre em paralelo e concomitante às mudanças. Mas, um ponto importante
merece destaque: não importa se acham; o que não acham; se gostam ou se não gostam. Que alívio poder isso dizer, gritar, espernear. Muito tempo foi
perdido! O tempo do egoísmo saudável chegou; chegou também o tempo das
vitórias, das alegrias simples, das risadas ainda mais espontâneas, de
amar em mais qualidade, sem pensar nas quantidades, de alimentar a fome insaciável
pelo bem fazer, pelo bem querer, bem pelo agir, pelo desejo infindável por
expandir a todo o momento o meu cerne infinitamente tão grande, porém tão
adormecido. Ah! Mas o tempo de acordar chegou!
Um dia, ao acordar de inúmeros
sonhos ilusórios, via apenas carcaças à frente... Algumas belas,
outras não tão belas assim, o que não é pertinente. Então, vislumbres assustadores
preencheram os olhos: o que havia dentro do por dentro das
carcaças... O Julgamento! Julgar, julgar e julgar. Fazemos tanto e
não nos damos conta do quanto. Quantificando o julgamento, podemos chegar
na seguinte fórmula: pré-visualização + pré-audição + preconceituação/síntese (não
necessariamente nesta ordem, e não necessariamente utilizamos todas as
'incógnitas').
Explanando: Julgamos,
previamente, pelo que vemos (a mãe dos julgamentos), pelo que ouvimos, e depois (lembrando que a
ordem pode se inverter) sintetizamos de forma arbitrária e temerária o que
vimos e ouvimos em um composto, por vezes pútrido e fétido, que a nós
muito cai bem: o do julgamento, em sua forma mais vil e covarde. Tantos
cegos de alma que insistem em julgar pela carcaça (como me dão pena!), focados
tão somente no o que a carcaça tem a lhes oferecer, sem nenhum interesse
no imo, no cerne, no amago daquela carcaça que pode ser maravilhosa por fora, e
horripilante por dentro, de dentro. Nada escapa aos olhos incansáveis dos
julgadores: a cor da pele; o estado da pele; a orientação sexual (Por favor!
Aos leigos, parem de proclamar ‘Opção Sexual’ aos sete ventos!); o tipo de
cabelo; a altura; os traços; os jeitos (e trejeitos); as estrias; as
celulites; a flacidez etc.
Tantos surdos de alma que insistem em julgar
pelo que ouvem, QUANDO OUVEM (há os que julgam pelo que não ouvem)! Julgadores
de muitos vômitos sonoros sem sentido, sem valor, despretensiosos. Julgadores
do não dito, do inaudível, do uníssono! Julgadores sem a capacidade de
interpretação do silêncio ou do que realmente ouviram, sem a menor capacidade e
interesse de aplicar o mínimo de hermenêutica antes de se deflagrar o processo
julgador. Julgadores do 'ouvi falar', do 'fiquei sabendo', do 'disse-me-disse'.
Quanta falta de vergonha... Quanta audácia... Quanta impertinência... Quanta
falta de ocupação da mente e do tempo (lembra dele?)!
E depois de todos esses
julgamentos prévios, vem o pior: a síntese. A síntese da doença do
pré-julgamento. Quem nunca o fez? Tantos ainda fazem. Tantos ainda se utilizam
de suas inúteis sínteses acumuladas sobre tudo e todos, a todo o momento... É
parâmetro, paradigma, estigma, um dogma só nosso, que nos auto titulamos
'seres superiores' (muitas gargalhadas altas!).
Utilizamos destas sínteses como
verdade e razão absolutas e inexoráveis para nortear as ações advindas do
julgamento... Que nojo, não? Agora você conhece o de dentro, por
dentro, da carcaça do julgamento. Viu o quão absurdamente absurdo ela
é? Sim? Então livre-se dela. Um interior doente não significa um interior
perdido. Há tempo (de novo!)! Chega de julgar o mal visto, antes de ver atrás de
seus olhos, no fundo do profundo você! Chega de julgar o mal ouvido (e o
silêncio do nao-dito), antes de se atentar às enfermidades que, sonoramente, regurgita!
Chega de formular sínteses cruas, cruéis, incompletas, incongruentes,
insolúveis, imutáveis, sem antes provar da própria síntese que
fazem de você (sim, fazem!) todos os dias, a todo o tempo (!), perdendo-se
exatamente isso: tempo!
Finalmente, e deverás
precípuo, é tempo de se virar, de se contornar para dentro, por dentro...
Ainda há tempo! Tempo de adentrar a carcaça, e consumi-la, até que reste a sua
própria e serena... Síntese!
Dica: se você, assim como eu,
já julgou, independente do quanto, da
próxima vez que se pegar no início do processo de julgamento do outro, sugiro
que: vá ler um bom livro ou até mesmo um ruim, ou vá estudar, ou vá ver um
filme ou seriado, ou vá trabalhar, ou vá dormir, e, simultaneamente a estas
opções, vá tentar se preocupar um pouco mais com a sua vida... Não há tempo!
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